sábado, 10 de maio de 2008

Pelos meus olhos choro Myanmar








Pode um regime autoritário deter uma revolução e a sua divulgação?
Tomamos por exemplo um país governado por um regime de Ditadura chefiado por uma força militar, desde 1962, a Birmânia, actualmente designada por Myanmar.
Actualmente com 50 milhões de habitantes, Myanmar tem sido palco da manifestação de pressões sociais que aludem a um grau de insatisfação da população face ao regime dos generais. O tema deste trabalho pretende, mais do que uma reflexão, ser um pequeno contributo para a compreensão do conflito, aos olhos da Psicologia Social. Tal é feito com base na análise documental de informações difundidas a respeito do conflito, no final de 2007. Face à existência de evidentes sinais da opressão exercida por um grupo dominante, os generais, sobre um grupo dominado, a população em geral, não posso deixar de condenar a forma como a Junta Militar está dizimar, como uma espécie de genocidio camufaldo, o seu povo. Ao impedir a entrada de ajuda humanitária no país, as chefias militares da antiga Birmânia estão esquartejar os Direitos Fundamentais da Humanidade, nomeadamente no acesso à assistência em caso de catástrofe - neste caso, de ordem imposta pela Natureza. Ainda mais triste é o mundo inteiro assistir a esta devassa sem ainda ter interferido, de concreto, para além da diplomacia.

Com maior evidência se coloca a questão quando se assiste a, mais um, "cerne" de um conflito que já dura há décadas. Refiro-me, em particular, à tomada de posição pelos monges budistas e à sua consequente acção em manifestações de rua, mais ainda, quando tradicionalmente se trata de um grupo estritamente pacifista e recluso no seu mundo particular.

Mas o que pode explicar tal intervenção budista?

Aos olhos da Psicologia Social, o conflito assume um papel preponderante na regulação de tensões sociais. Pode produzir o equilíbrio intragrupo ou intergrupos (Cerclé, A; Somat, A: 64). Quando o conflito começa, aumenta a coesão intragrupo e a rejeição e diferenciação do grupo exterior. A percepção e as qualidades das motivações ficam alteradas, sobretudo no que toca aos aspectos negativos. Apesar de viverem exaustivamente no isolamento, os monges surgem no intragrupo dos opositores ao regime como aliados com uma grande afinidade para os populares. Essa ligação fortalece à medida que aumenta a tensão existente com o regime ditatorial dos generais.
No exemplo que se apresenta, as manifestações assumidas pelos monges budistas são de facto uma inovação, mas tendo como linha de base a dinâmica intragrupo. Trata-se de um conflito que diz respeito a controvérsias que preocupam o grupo social do qual se integram os opositores ao regime birmanês.
As manifestações espelham a frustração vivida pelo grupo dominado e, ao mesmo tempo, traduzem a acção de uma agressão ao grupo dominante pelo suposto elo mais fraco – o grupo dominado. Na verdade, a passividade anterior às manifestações já demonstrava essa mesma frustração. Todavia, no seio deste grupo que enfrenta a impossibilidade de chegar ao seu fim, a agressão surge segundo as modalidades de interconhecimento existentes no grupo. É assim que a passividade budista dos monges se alia à causa da população birmanesa. À medida que a tensão aumenta, observa-se que se dividem em subgrupos que não se conhecem mas que procuram juntos uma resolução rápida para o conflito. O grau de consenso do grupo dominado está determinado pela convergência da causa e pela afinidade que existe entre valores e fundamentais comuns.
“Nas situações de conflito, os grupos minimizam a sua similitude e acentuam a sua diferença” (Cerclé, A; Somat, A: 101).
O grupo dominado e o grupo dominante traçam fronteiras claras e distintas. Atribuem-se características negativas e intenções malévolas que se evidenciam no processo de categorização, cuja função simplificadora da realidade implica uma ampliação das diferenças intergrupos. Aqui, têm em curso os processos de definição de identidade social e de estruturação do meio social. “O facto de partilhar uma sorte comum leva os indivíduos a efectuar uma discriminação avaliadora a favor do grupo de dependência” (Cerclé, A; Somat, A: 104).
Óbvio será referir que este é um trabalho bastante limitado, pois seria exigível um nível de recursos e de acessos a dados e fontes bastante mais amplos. Contudo, a partir de uma análise de conteúdo de notícias de fácil acesso a todos é possível transpor algumas evidências da realidade psicossocial que o caso suscita. Quem sabe não estão lançados os primeiros dados para uma análise bastante mais aprofundada sobre a questão.
Em suma, actualmente trata-se de uma matéria que suscita um amplo debate académico de portas abertas para o exterior visto, existirem inúmeros tiques de obediência cometidos por regimes de naturezas diversas, incluindo da própria Democracia.

Actualmente, o clima de conflito não se esbate e as rédeas dos protestos passam a ser conduzidas por jovens. Apesar da mão austera do regime, os jornalistas continuam a conseguir publicar relatos da situação vivida em Myanmar, nomeadamente a deixar transparecer o clima de “indignação geral” da população e que está a “tornar-se insustentável para o regime dos generais”. Só se espera é que algo mais se faça por este povo sugado pelas rédeas de um regime execrável.
Ver aqui e aqui.

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